Jornal de Guimarães, Música

JdG / A Ouvir #31

The Legendary Tigerman / Zeitgeist

(Tigre Branco, LP, 2023)

A primeira vez vez que vi The Legendary Tigerman foi em 2005, no Café Concerto do Centro Cultural Vila Flor, apinhado de gente. Nessa altura, o ex-Tédio Boys já tinha lançado dois discos, que apontavam um caminho de sucesso, que acompanhava a tendência internacional de ressurgimento do rock. Era na altura em que Paulo Furtado se apresentava em formato one man band. Foi um concerto poderosíssimo, cheio de adrenalina e suor, como convém num concerto de rock. Vi-o já algumas vezes depois desse concerto, mas não mais me esqueço daquele primeiro encontro. Inclusivamente, viria a programá-lo na temporada de lançamento dos Banhos Velhos, em 2011. Com o passar dos anos, Paulo Furtado tem procurado reinventar-se, tentando desviar-se de uma fórmula que é por definição limitada, mas mantendo sempre presente a matriz blues-rock que o caracteriza. Há frequências sonoras, que guitarra-baixo-bateria não conseguem preencher. Foi ao ver um concerto de música eletrónica que Paulo Furtado percebeu isso mesmo e decidiu de vestir outro figurino, recorrendo a sintetizadores e sequenciadores. É assim que chegamos a “Zeitgeist”, o disco mais interessante de The Legendary Tigerman desde “Femina”, de 2009. As canções soam mais experimentais, exercícios de remistura, como se tivesse havido um outro disco antes deste, feito com recurso aos instrumentos habituais. Tal como havia feito em “Femina”, acompanham-no outras vozes, como a de Asia Argento (que também participou em “Femina”), Jehnny Beth (Savages) e Delila Paz (The Last Internationale). “Zeitgeist” é um disco inconformado, que foge de todos os lugares de conforto que The Lagendary Tigerman ocupou até agora. Oportunidade para vê-lo ao vivo, no dia 24 de fevereiro, no Centro Cultural Vila Flor.


Micro Audio Waves / Glimmer

(Edição de autor, LP, 2024)

O trajeto dos Micro Audio Waves é discreto. Diria que não será uma banda transversal, a sua música não é orelhuda. A carreira deste projeto tem sido levada com longos tempos entre discos. A música não é imediata, não entra na primeira audição. Há sempre algo perturbador na música dos Micro Audio Waves, algo se estranha e que se entranha logo a seguir. Contudo, este “Glimmer”, saído no início do mês de fevereiro é um disco sem essas arestas, que criavam uma espécie de abrasão no ouvido. É um disco com arranjos que não se desviam da pop, com uma presença preponderante das eletrónicas. Não obstante, o disco é também muito orgânico, com o baixo pungente de Francisco Rebelo e os arpegios de Flak na guitarra. Este, com Carlos Morgado, é responsável pela camada sintetizada do disco. Cláudia Efe mantém a sua personalidade vocal inalterada desde que a ouvi pela primeira vez. Talvez neste disco recorra menos a dissonâncias, que era o que, em parte, muito contribuia para a estranheza que se sentia nos discos anteriores. O disco de 2010, “Zoetrope”, deu origem a um espetáculo irrepreensível do ponto de vista visual. Quem o viu certamente que o terá presente na sua memória. Também em “Glimmer” houve um trabalho conjunto da banda com o coreógrafo Rui Horta, o que originou um espetáculo que, no palco, conta ainda com a interpretação de Gaya de Medeiros. “Glimmer” estreou em Aveiro, coincidindo com a saída do disco e está a circular pelo país. Dia 9 de março terá passagem pelo Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães.

Estes textos foram originalmente publicados na edição de fevereiro de 2024 da revista do Jornal de Guimarães.

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